O caminho do discípulo: da Cruz à glória da Ressurreição

            Paz e bem!

            Estamos neste caminho de conversão que quer conduzir a cada um de nós no mais profundo mistério de amor: a Cruz. Como nós ouvimos da Primeira Carta aos Coríntios: “os judeus pedem sinais, e os gregos andam em busca de sabedoria; nós, porém, anunciamos Cristo crucificado (…) mas para aqueles que são chamados, é Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus” (1Cor. 1, 22.24). Não é possível ao discípulo tornar-se discípulo sem esta condição: renunciar a si mesmo e tomar a cruz e ir em seguimento de Jesus Cristo (cf. Mateus 10,37-39). É esta via segura que torna o discípulo de Jesus dif erente dos discípulos de outros senhores e mentalidades que o mundo quer nos impor. O caminho da cruz é o caminho da perfeição de vida pois contemplamos a perfeição do amor que foi crucificado. Ela é a porta estreita por excelência que orienta o discípulo a algo maior e mais belo do que aquilo que o mundo pode esperar dos seres humanos.

            Mas para que possamos seguir por esta via é-nos exigido uma profunda busca de encontro com Deus, com o próximo e conosco mesmos através de um itinerário de conversão. Conversão que deve brotar do mais íntimo de nós para alcançar ao grandiosíssimo projeto do Pai em favor de nós e do outro. Não é fácil entrar na conversão, pois não é fácil olhar para a nossa verdade e nossa realidade. Sempre é mais fácil e cômodo deixar-se inquietar com o pecado, a miséria, a debilidade do outro do que ter a coragem de olhar para dentro de nós mesmos. Isto vai exigir renúncia! E não é apetitoso um ato de renúncia. Não numa cultura como a nossa em que vivemos marcados pela intolerância, pela polarização, pelos memes que ditam regras de vida; tudo menos a Palavra de Deus e o convite do Senhor.

            E diante de todas estas realidades nos encontramos com o desejo da vitória, que se culmina na glória da ressurreição. Mas esta glória não ameniza e muito menos exclui o mistério da cruz. Há uma profunda relação entre uma realidade e outra. Basta olhar para o Tabor. Ali está a prova e a condição definitiva para o cristão. E entre uma dinâmica e outra há uma condição essencial para o discípulo: escutar e obedecer ao Senhor Jesus. (cf. Mateus 17,5). Desta forma expressou de maneira única e singular o saudoso papa São João Paulo II: “O sofrimento humano constitui em si próprio como que um « mundo » específico, que existe juntamente com o homem, que surge nele e passa, ou então que as vezes não passa, mas se consolida e aprofunda nele. Este mundo do sofrimento, abrangendo muitos, numerosíssimos sujeitos, existe por assim dizer na dispersão. Cada um dos homens, mediante o seu sofrimento pessoal, por um lado constitui só uma pequena parte desse « mundo »; mas, ao mesmo tempo, esse « mundo » está nele como uma entidade finita e irrepetível. A par disso existe também a dimensão inter-humana e social. O mundo do sofrimento possui como que uma sua própria capacidade. Os homens que sofrem tornam-se semelhantes entre si por efeito da analogia da sua situação, da provação do destino partilhado, ou da necessidade de compreens&atild e;o e de cuidados; mas sobretudo, talvez, por causa do persistente interrogar-se sobre o sentido do sofrimento. Embora o mundo do sofrimento exista na dispersão, contém em si, ao mesmo tempo, um singular desafio à comunhão e à solidariedade.”   (Carta apostólica Salvifici Doloris n.8)

            Desta forma concreta seremos capazes de entender em nós à luz de fé em Cristo este mistério que abraçamos de forma plena no cristianismo. É algo que só pode tornar-se realidade à medida que estamos atentos à voz de Cristo. Sem esta escuta não haverá possibilidade alguma de obediência e sem estes ambos elementos nunca será possível alcançar a santidade de vida e o testemunho alegre de nossa pertença ao Senhor.

            A cruz é condição necessária para o discipulado e para que ela seja compreendida de maneira integral e correta precisamos olhar para o eterno de Deus e suas promessas feitas através de Jesus Cristo. Se um cristão não vive em profunda união com a Igreja, sobretudo o Tríduo Pascal, nunca poderá compreender na sua vida e história tamanha grandeza deste amor que se deixa ser macerado e humilhado, e que na obediência ao Pai cumpre a nossa salvação. Infelizmente há muitos cristãos que vivenciam apenas uma parte deste mistério de amor. E o tríduo pascal começa na quinta-feira santa da instituição da Eucaristia, passa pelo mistério da Cruz na sexta-feira da paixão, se prolonga na Vigília Pascal e culmina no Domingo da Páscoa da Ressurreição.

            Oxalá possamos de fato fazer nossa profunda experiência de vida cristã com o Senhor desde o caminho da Cruz à glória da Ressurreição.